terça-feira, 17 de abril de 2012

Técnicos escolares terão que seguir novas regras após caso de abuso sexual nos EUA


O ex-professor Eric Justin Toth é acusado de pornógrafo infantil, quando encontraram imagens de crianças em uma câmera que usava no trabalho; ele encabeça a lista dos dez mais procurados pelo FBI
O ex-professor Eric Justin Toth é acusado de pornógrafo infantil, quando encontraram imagens de crianças em uma câmera que usava no trabalho; ele encabeça a lista dos dez mais procurados pelo FBI
O caso de Jerry Sandusky, um ex-coordenador de defesa do time de futebol da Penn State acusado de dezenas de atos de abuso sexual de menores, está tramitando nos tribunais. Mas está tendo um impacto duradouro sobre milhares de outros técnicos, tanto pagos quanto voluntários, que se veem diante de um novo escrutínio por parte dos pais, organizações esportivas e até legisladores estaduais.
Desde que o escândalo da Penn State veio à tona em novembro, legisladores em mais de uma dúzia de estados -incluindo Nova York, Califórnia e Pennsylvania- entraram com projetos de lei para que técnicos, diretores atléticos ou funcionários das universidades sejam "obrigados a denunciar" se suspeitarem de abuso ou negligência para com as crianças. No mês passado, leis como estas foram aprovadas na Virgínia, Washington e West Virgínia, e vários outros estados devem seguir o exemplo em breve.
Embora as leis variem, algumas impõem punições significativas, incluindo multas, acusações por delitos e até tempo de prisão, para técnicos ou funcionários que violem as novas leis de denúncia.
As leis, como um todo, têm a intenção de evitar que se repita a resposta aparentemente negligente dos funcionários da Penn State -inclusive do falecido técnico Joe Paterno. Segundo críticos da universidade, foi isso que permitiu que Sandusky continuasse abusando de crianças durante anos, depois que as suspeitas surgiram.
"O que vimos na Penn State foi uma conspiração de silêncio, e este é o principal alvo do meu projeto de lei", disse o representante estadual Kevin Boyle, democrata que entrou com o projeto de lei na Pennsylvania em meados de novembro. "Quero impedir que as instituições mantenham os abusos em segredo."
De acordo com a Conferência Nacional de Legislativos Estaduais, que acompanha essas leis, a maioria dos estados diz exatamente quais profissões são obrigadas a delatar o abuso infantil, entre elas professores, assistentes sociais e funcionários da saúde. E os legisladores dizem que as novas leis propostas não têm a intenção de lançar dúvidas sobre técnicos inocentes, mas simplesmente fechar as brechas onde eles não são citados especificamente nas leis de denúncia de abusos.
"Tomara que este seja um passo positivo em vez de punitivo", disse o legislador Roger Dickinson, democrata que apoiou um dos vários projetos de lei ainda pendentes na Califórnia.
As checagens dos históricos dos técnicos também cresceram, assim como as iniciativas para acabar com as brechas nessas checagens. Este mês, o Conselho Nacional de Esportes Juvenis deve anunciar um critério mais rígido e amplo, acrescentando especificamente a uma lista de "alerta" qualquer condenação ou acusações pendentes envolvendo exposição indecente, prostituição ou crimes envolvendo danos a um menor, para alertar as ligas a não convocarem voluntários questionáveis.
As novas regras, que deverão ser usadas nas ligas de vários esportes para determinar quem pode ser técnico, devem fortalecer uma série de normas de "tolerância zero" que já listam crimes como a crueldade contra animais e posse de drogas como ofensas que podem desqualificar o candidato, não importa quando tenham acontecido.
"Se alguém quer ser voluntário, e acha que não deve porque se preocupa com o que quer que tenha acontecido no passado, então não se voluntarie", disse Sally S. Johnson, diretora-executiva do conselho. "Tenho certeza que há outras pessoas por aí que querem ser técnicos".
Apesar de todas as mudanças concretas que afetam os técnicos, a nova supervisão também levou a mudanças mais sutis nas atitudes e abordagens. "Eu sei que os pais dos meus jogadores nunca suspeitariam que eu me portasse mal", disse Raven Scott, jogador de vôlei na escola de segundo grau Millsaps College em Jackson, Mississippi, que também é técnico de um time feminino. "Mas ao mesmo tempo, sei que agora eles estão ainda mais inclinados a estarem presentes em práticas para monitorar com uma mentalidade de 'apenas para garantir'".
Os técnicos – muitos dos quais são pais também – disseram que estavam mais cientes de como se comunicam com os jogadores. Alguns dizem que passaram a enviar mais e-mails e textos para suas equipes, para fornecer um registro das interações no caso de que surjam acusações, enquanto outros disseram que também mudaram a forma de cumprimentar os vencedores ou consolar os perdedores.
"Eu fiquei ainda mais cuidadoso ao abraçar os alunos", disse Dug Barker, administrador de sistemas e pai de quatro em Louisville, Kentucky, que é técnico de vários esportes desde o final dos anos 70. "E tenho muito cuidado com palavras e frases que podem ter duplo sentido."
O escândalo de Sandusky também revelou códigos de conduta há muito praticados: evitar trabalhar sozinho com os jogadores, por exemplo, ou dar caronas para casa sem outro adulto ou jogador no carro. O contato físico – uma mão no braço para ajustar um movimento, por exemplo – deveria ser anunciado antes.
Tudo isso não serve somente para proteger as crianças, mas também as reputações dos técnicos. Karen Ronney, instrutora de tênis profissional e mãe de três meninas que praticam o esporte em San Diego, disse se lembrar de ser "extremamente cautelosa quando trabalha com crianças" - apesar de anos de experiência na lateral das quadras.
"Uma situação potencialmente negativa pode destruir uma carreira ou uma vida", disse Ronney. "Possivelmente a minha."
Organizações que representam os esportes juvenis também tomaram medidas em resposta ao caso de Sandusky. Em novembro passado, a Liga de Beisebol Infantil reiterou suas normas para reportar abusos – e para identificar potenciais autores de abuso sexual de menores – depois de ouvir pais e voluntários. Em fevereiro, a Positive Coaching Alliance, um grupo sem fins lucrativos de Mountain View, California, realizou dois seminários online dedicados a impedir o abuso sexual de menores. O fundador do grupo, Jim Thompson, disse esperar que as discussões encorajem os técnicos a agirem como sentinelas para o potencial abuso ou negligência de menores.
"Parte de nossa mensagem para os técnicos é: 'não seja defensivo, não leve para o pessoal'", disse Thompson. "Não pense: 'eu sou um cara legal, por que as pessoas suspeitariam de mim?' Reconheça que se trata de uma comunidade tentando proteger as crianças e abrace seu papel de protegê-las."
Os seminários online incluem sessões sobre as "seis medidas a tomar se uma criança menciona algo sobre ser abusada", bem como as "seis formas de evitar ser falsamente acusado de abuso".
"Se uma criança disser que você está sendo abusivo, não tente evitar ou negar", diz uma dica da apresentação. "Em vez disso, use isso como um momento de ensinamento. Você pode dizer: 'obrigado por me dizer isso. Sinto muito que isso tenha incomodado. Os problemas não devem ser segredos, e vamos conversar sobre isso com seus pais'."
Talvez nenhum outro lugar tenha ficado mais abalado com o escândalo de Sandusky do que cidades como Mill Hall, Pennsylvania, na mesma rua do State College, que abriga a Penn State. Bill Garbrick é técnico da Little League, e segundo muitos relatos, um modelo para os demais: humilde, trabalhador e dedicado à sua equipe, um time bem sucedido que liderou durante todo o caminho para a Série Mundial da Little League no ano passado, também sediada ali perto, em Williamsport, Pennsylvania.
Ele disse que o escândalo de Penn State havia sido "bem perto de casa" e certamente poderia deixar alguns técnicos incomodados. "Se técnico novo chegar na liga, tenho certeza que será muito cauteloso", disse ele.
Os pais de seus jogadores dizem que também ficaram estremecidos com as alegações de Sandusky, embora não se preocupem com seus filhos ficarem longe de casa para dormir fora durante a Série Mundial da Little League.
"Eu sempre me senti segura com eles", disse Shelli McCloskey sobre Garbrick e seus colegas técnicos, que foram técnicos de seu filho Tyler durante vários anos. "Eles são muito respeitados pelas crianças."
Numa noite de sexta-feira recente, enquanto Garbrick observava sua equipe treinar, admitiu que o caso de Sandusky era difícil de evitar. Mas disse que estava muito mais preocupado com as crianças que foram supostamente abusadas.
"Como isso afeta o trabalho do técnico na Little League? Certamente o tornará um pouco mais difícil", disse ele. "Mas isso é apenas uma pequena parte."
Tradutor: Eloise De Vylder


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